Revelamos aqui as causas e efeitos da insegurança pública e jurídica no Brasil, propondo uma ampla mobilização na defesa da liberdade, democracia, federalismo, moralidade, probidade, civismo, cidadania e supremacia do interesse público, exigindo uma Constituição enxuta; Leis rigorosas; Segurança jurídica e judiciária; Justiça coativa; Reforma política, Zelo do erário; Execução penal digna; Poderes harmônicos e comprometidos; e Sistema de Justiça Criminal eficiente na preservação da Ordem Pública e da incolumidade das pessoas e do patrimônio.

domingo, 17 de janeiro de 2016

O TERROR E A VIGILÂNCIA

 

ZERO OHORA 17 de janeiro de 2016 | N° 18417


EDSON PASSETTI*


Atentados provam que o Estado Islâmico sabe provocar em seus alvos reações que aumentam o número dos seus guerreiros voluntários



Previsto por analistas, comentaristas e, principalmente, pelas agências de inteligência, mais um evento terrorista do Estado Islâmico (EI) ocorreu na noite de 13 de novembro de 2015, novamente em Paris. Homens-mártires atiraram para matar pessoas dentro e fora de espaços de entretenimento.

Para o EI, nada de pensamento livre e crítico como o do Charlie Hebdo; nada de costumes ocidentais de lazer, turismo, ou outra religião, Estado etc e tal. Ele forçou o governo francês a decretar o estado de emergência; tentou inibir a presença europeia na guerra declarada contra si no Iraque e na Síria; provocou, acoplado à derrubada de avião russo pela Turquia, o vazamento de informação de que esta seria a maior compradora do petróleo sob sua gestão; fez irradiar uma campanha ocidental intensa contra o recrutamento de jovens europeus por meio de redes sociais; colocou em xeque as medidas de integração promovidas pela Bélgica; avolumou as suspeitas sobre os refugiados que desembarcam nas praias gregas; provocou o reaparecimento de práticas de Estado do nazismo no controle e translado de refugiados; calou os moderados islâmicos pacifistas.

O EI pretende instituir seu califado unificador e para tal produz efeitos em fluxos a partir de suas investidas estratégicas pelo terror no ocidente. Dissemina o medo, fomenta a guerra, anula diplomacias e despreza a democracia. Sua conduta também acende imprescindíveis ligações diplomáticas em blocos que opõem adversários de velhos tempos como Rússia e Estados Unidos (aproximados como sempre de Inglaterra e... França), além de almejar submeter os xiitas. Trata-se, enfim, de uma religião cindida politicamente.

É um grupo que sabe o que quer e como jogar com as forças organizadas. Deseja levar ao limite as novas tecnologias de combate e, ao mesmo tempo, glorificar seus mártires para instituir uma religião exclusiva. Tem seu exército recrutado de variados modos, mas no principal não se diferencia das forças armadas dos demais Estados. O EI, com sua presença terrorista em 13 de novembro, moveu os jovens franceses a se alistarem nas suas forças armadas. Evidenciou-se com isso que os Estados, sob qualquer regime, estão organizados para guerras, precisam de guerras para manter suas respectivas seguranças, e contam para tal com a adesão da grande maioria da população. Enfim, EI e seus Estados inimigos se equivalem.

As elites ocidentais estão interessadas em fraternidade, o terceiro vértice do triângulo equilátero herdeiro da Revolução Francesa, e contam com o pacifismo islâmico para levá-lo a resplandecer. O planeta cada vez mais governado para a democracia de inspiração estadunidense se mantém na rota da boa governança com sua gestão transterritorial afiançada pelo Conselho de Segurança da ONU, forças empresariais, sociedades civis organizadas e parlamentos conectando esforços para a realização do desenvolvimento sustentável até 2030, com ou sem EI.

As resistências em Kobane, até agora, por meio da ação direta, eram as únicas a conter a proximidade e ocupação de área pelo EI. Porém, em 21 de julho de 2015, em represália, o EI realizou o atentado no Parque Cultural Amara, em Sirouç, na fronteira entre Turquia e Síria próxima a Kobane, matando cerca de 30 pessoas. Mais tarde, no final de dezembro, o Iraque, com apoio dos Estados Unidos, retomou Ramadi. Se o EI passou a ter complicadores para suas ambições no combate a seus opositores, isso não reduziu a adesão de mártires e mantiveram-se as táticas inesperadamente previsíveis. O EI, simultaneamente, põe em xeque o monitoramento inteligente atual e colabora para seu incremento, pois a obsessão por segurança atinge a quase todos.

Na Europa, assim como nos Estados Unidos, tudo depende do eficiente monitoramento de pessoas, grupos inimigos, infiltrados, áreas de circulação, controles aéreos, alvos bem delimitados para efeitos de bombas para a boa gestão dos combates ao inimigo declarado. Mas como essa é uma guerra nada convencional, ela produz estados de violências quase incontroláveis, porque o EI é capaz de espantar a qualquer momento. Na manhã de 12 de janeiro de 2016, no bairro turístico de Sultanahmet, próximo à Mesquita Azul, em Istambul, na ambígua Turquia, sucedeu uma terceira ofensiva com mortos – depois de Surouç e do atentado de 10 de outubro próximo à estação de trem de Ancara, durante manifestação pró-criação do Curdistão, deixando outros 97 mortos.

Imagina-se que as redes de segurança transterritoriais estejam mapeando possíveis outras miras do E.I.. Enquanto isso, as populações temerosas clamam por mais segurança e, a seu modo, proporcionam o crescimento dos monitoramentos estatais assim como de forças fascistas, institucionalizadas ou não nos parlamentos. O EI explicita como a Al Qaeda introduziu um programa de expansão fundamentalista islâmica e que ele sabe, pelo menos até agora, como produzir variadas interfaces tornando difícil sua contenção. Talvez busque, no futuro próximo, uma medida drástica em termos políticos e ambientais. A derrubada do tirano sírio, nesse contexto, não passa de um chiste para a governança planetária. Não há nada de novo no front.

Professor no Departamento de Política e no Programa de Estudos Pós-graduados em Ciências Sociais da PUC-SP*

A CORRUPÇÃO NO MÉXICO VAI ALÉM DE EL CHAPO



ZERO HORA 17 de janeiro de 2016 | N° 18417




POR MIGUEL GUEVARA*




No dia 8 de janeiro, o chefão do tráfico Joaquín Guzmán Loera, mais conhecido como El Chapo, foi capturado por fuzileiros navais mexicanos no Estado de Sinaloa, no norte do país. Ele havia escapado seis meses antes da prisão, um duro golpe para o presidente mexicano Enrique Peña Nieto. Após a fuga, a popularidade interna do presidente sofreu uma grande queda, e outros países começaram a questionar a capacidade das instituições mexicanas para garantir o cumprimento da lei. Peña Neto celebrou triunfalmente no Twitter a recaptura de El Chapo. Entretanto, não está nada claro se a prisão de Guzmán terá um efeito positivo significativo sobre a imagem severamente danificada do presidente.

El Chapo sempre foi uma figura escorregadia para as autoridades mexicanas. Sua primeira fuga da prisão foi em 2001, escondido em um carrinho de lavanderia. Ele permaneceu foragido por 13 anos. Nesse meio tempo, consolidou seu império de drogas: o Cartel de Sinaloa, no oeste do México. El Chapo sempre atraiu o fascínio dos mexicanos, muitos dos quais o veem como uma espécie de Robin Hood. Em Sinaloa, era conhecido por sua generosidade para com a população local.

Os presidentes conservadores Vicente Fox e Felipe Calderón, do Partido da Ação Nacional (PAN), que governaram o país de 2000 a 2012, alegadamente caçaram Guzmán. No entanto, nenhum deles foi capaz de capturá-lo. Teorias conspiratórias surgiram apontando para um possível arranjo clandestino entre El Chapo e os governos de direita.

Em 2012, Peña Nieto assumiu, restaurando no poder o Partido Revolucionário Institucional (PRI), de esquerda, que havia governado o México por quase um século. Em 2014, com menos de 18 meses na presidência, ele capturou Guzmán. Na época, o governo desfrutava a bonança do apoio internacional à sua ousada agenda reformista, incluindo a reformulação do setor de telecomunicações e um golpe contundente contra o sindicato mais poderoso do país. A revista Time até rodou uma capa com um Peña heroicamente enquadrado sobre a manchete “O Resgate do México”.

Mas a lua de mel não durou muito. Naquele mesmo ano, 43 estudantes da Escola Rural de Ayotzinapa desapareceram no sul do México. Poucos meses depois, um grupo de jornalistas revelou o escândalo de um conflito de interesses envolvendo a mulher do presidente – e depois disso, todos perderam seus empregos. Em seguida, a economia dependente do petróleo começou a sofrer diante dos preços baixos. Finalmente, em julho do ano passado, El Chapo se tornou notícia de novo: ele escapou da prisão por um engenhoso sistema de túneis, como algo saído de um filme de Hollywood.

Após a fuga, a mídia internacional começou a olhar mais criticamente para Peña Nieto, se perguntando como as coisas puderam dar errado tão rápido. Tem sido consenso afirmar que a principal fraqueza do México reside em suas instituições e em seu débil Estado de Direito.

Autoridades do governo têm usado a recaptura de Guzmán para argumentar que as instituições do país estão fortes e ativas. O ministro da Economia do México declarou recentemente: “A captura de El Chapo gera otimismo no mundo para o México, e isso incentiva o investimento estrangeiro, sinalizando que, no país, o Estado de Direito prevalece.”

Pode ser muito cedo para comemorar. O México ainda enfrenta problemas fundamentais. Até agora, nenhum oficial de alto escalão foi acusado de cumplicidade na fuga de El Chapo no último verão: apenas funcionários de nível médio foram condenados. Especialistas em segurança se perguntam como os homens de Guzmán conseguiram escavar túneis não detectados durante meses sem ter o apoio dos mais altos níveis de governo.

O presidente do Banco Central do México disse publicamente na semana passada: “A falta de segurança aumenta a incerteza e inibe o investimento”. Altos executivos dificilmente ficarão impressionados com a recaptura de El Chapo. As empresas perdem milhões de dólares todo ano devido ao ambiente de insegurança do país, e os gerentes lidam todos os dias com funcionários corruptos do governo.

Não é nenhuma surpresa que, depois da captura de Guzmán, muitos tenham se perguntado quando ele será extraditado para os Estados Unidos. Muitos mexicanos supõem que ele iria enfrentar um processo penal mais duro nos EUA do que em casa. As autoridades mexicanas também sabem disso, e é de se imaginar se é do interesse delas extraditá-lo.

O cartel de Sinaloa tem sido capaz de prosperar por causa de suas ligações diretas com os governos locais e federal. O sucesso de El Chapo é o produto de um sistema político corrupto. Ele sabe muito sobre muita gente. Se for extraditado para os EUA, provavelmente vai compartilhar com as autoridades os nomes daqueles que tornaram esse sucesso possível. Esta seria uma má notícia para a elite política mexicana, uma coorte muito coesa. Se ele compartilhasse o que sabe, poderia desencadear um efeito dominó que paralisaria as carreiras de muitos políticos ambiciosos.

No entanto, não extraditar El Chapo representa um desafio diferente para o governo. Depois de sua recaptura, ele foi levado de volta para a prisão da qual escapou em julho. Uma nova campanha presidencial começa no próximo ano, e se Guzmán escapar mais uma vez, isso não só seria um grande golpe para Peña Nieto, como também provavelmente colocaria em perigo seu próprio partido.

As apostas do governo mexicano são altas. O país está passando por uma desvalorização em câmera lenta de sua moeda, enquanto um déficit de dólares do petróleo está comprometendo as finanças públicas. A violência do narcotráfico em vastas áreas do país ainda não diminuiu. O ano mal havia começado quando uma prefeita recém-empossada foi morta ao sul da Cidade do México.

A menos que o governo de Peña Nieto possa demonstrar resultados reais do fortalecimento do Estado de Direito, os mexicanos dificilmente vão acreditar em suas promessas. A sombra de insegurança obscurece hoje cidades que antes eram consideradas refúgios seguros, incluindo a capital. Enquanto isso, a lua de mel entre o presidente e os investidores claramente acabou. Como Peña Nieto entra na fase final de sua presidência, ele enfrenta uma batalha difícil. Enquanto a captura de El Chapo pode fornecer um impulso momentâneo, os investidores estão bem conscientes dos problemas estruturais profundos do México.

Peña Nieto pode muito bem aproveitar a pequena vitória que alcançou. Mas prender um chefe do tráfico é a parte mais fácil.

Nascido e criado em Cuernavaca, México. Mestre em políticas públicas pela John F. Kennedy School of Government da Universidade de Harvard*

quinta-feira, 14 de janeiro de 2016

BRASILEIRO, MOSTRA A TUA CARA



ZERO HORA 14 de janeiro de 2016 | N° 18414



GEORGE ALEXANDRE FREIRE GOMES*



“O problema de Faoro, contudo, não é o Estado, e sim a natureza que ele assume nas condições históricas brasileiras (...), a dificuldade senão impossibilidade histórica do Estado racional liberal-democrático (...)”

Gabriel Cohen, prefácio de Os Donos do Poder, de Raymundo Faoro


Em tempos de crise global política e econômica, quando os velhos planos da racionalidade absoluta já não dão conta mais das contingências do mundo, quando a volatilidade das relações humanas parece mais caótica do que nunca, é possível visualizar uma grande chance para a nação brasileira.

Em tempos de um Brasil no qual as vozes do “complexo de vira-lata” bradam cada vez mais alto, mostrando um país incapaz de reverter seu próprio rumo histórico, um sentimento paira no ar e parece teimar em unir esquerdistas, direitistas, liberais, socialistas, conservadores, progressistas e tantos outros. É a necessidade urgente e inconteste de limpar o ambiente político do país e a corrupção endêmica que o assola, desde que nos conhecemos como tal.

Em tempos de modernidade líquida, para usar a expressão do sociólogo Zygmunt Bauman, temos uma oportunidade de nos unirmos contra um mal antes onipresente, mas sub- reptício, e que hoje começa a mostrar as garras explicitamente, nu e cru, em todas as mídias possíveis, saindo do imaginário do país para se concretizar em escândalos políticos cada vez maiores.

Em tempos como estes, em que se fala da retirada de direitos e do enfraquecimento do Estado para enfrentamento da crise, apresenta-se a chance ao povo brasileiro de extirpar de vez o mal congênito da politicagem, cortar na própria pele, arrancar o câncer que se alimenta desta nação e a impede de fazer valer os desígnios antigos que a nomeavam como o “país do futuro”.

Esse país do futuro, grande por natureza, grande porque seríamos capazes da miscigenação de raças, sem ódios ou extermínios vistos alhures, está nas nossas mãos, aguardando uma ordem nossa para surgir exuberante e capaz de encabeçar uma nova ordem mundial.

Esse país do futuro é o da concretização das promessas constitucionais de 1988 que refundaram a nação e a desenharam como uma República democrática e de direito, capaz de resolver suas desigualdades. Não tenhamos dúvidas, o Brasil do futuro que sonhamos, diferente daquele que Eric Hobsbawn chamou de “um monumento à negligência social”, passa pelo devido respeito ao Direito e pela real efetividade da Constituição.



*Advogado, mestre em Direito pela Unisinos