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quarta-feira, 9 de março de 2011

DESARMONIA - GOVERNADOR DO RS QUER BLOQUEAR SUPERSALÁRIOS NOS PODERES DE ESTADO


“Vou propor um teto de R$ 17 mil” - Tarso Genro, Governador do Estado do Rio Grande do Sul, Brasil. VIVIAN EICHLER - Zero Hora 09/03/2011

Para mexer no vespeiro da Previdência, o governador Tarso Genro decidiu antes colocar a mão em outro. Até o fim do mês, pretende enviar para a Assembleia uma proposta de emenda à constituição para reduzir o teto do funcionalismo em todos os poderes no Rio Grande do Sul.

Hoje, há dois limites em vigor. Executivo e Assembleia adotam a restrição de R$ 24,1 mil (90,25% do salário de ministro do Supremo Tribunal Federal). Os demais utilizam como parâmetro a remuneração de ministro do STF (R$ 26,7 mil). Tarso irá propor que novos funcionários e aposentados ganhem até R$ 17.347,14, o equivalente ao salário do governador. Ele condena a aplicação de dois valores e diz que a referência, neste momento, deveria ser de R$ 24,1 mil.

O governador não detalha como pretende convencer, por exemplo, o Tribunal de Justiça a aceitar o limite de R$ 17,3 mil para os futuros servidores. Ele deposita esperanças na mobilização da maioria do funcionalismo que recebe proventos inferiores ao teto atual.

O pano de fundo para a proposta é a negociação que pretende travar com os servidores para alterar a previdência gaúcha – cujo modelo atual é apontado por especialistas como insustentável. Entre as alternativas que costumam ser levantadas estão o fim dos pagamentos integrais e a criação de um sistema complementar.

Ontem, ao retornar da 34ª Romaria da Terra, em Candiota, Tarso disse a ZH que a negociação da reforma passa pela definição de um teto que reduza as diferenças entre os salários mais altos e os mais baixos no serviço público. Quer sentar-se à mesa de negociação com o mérito de ter, pelo menos, tentado.

As declarações foram motivadas pela informação publicada, ontem, de que o maior salário do Estado chega a R$ 52,6 mil. Confira trechos da entrevista:

Zero Hora – O senhor pretende adotar alguma medida para impedir a formação dos supersalários?

Tarso Genro – Vamos, até o fim de março, propor uma emenda constitucional para balizar os salários e, consequentemente, as pensões e aposentadorias no Estado a um valor não superior aos R$ 17 mil (R$17.347,14) que recebe o governador. Temos de fazer isso com muita atenção e muita responsabilidade porque, a partir daí, vamos poder discutir com seriedade a reforma na estrutura previdenciária para proteger os servidores públicos. Com essa situação que se tem hoje, em que todos os tetos são furados e que todos os limites são ultrapassados, é impossível pensar numa previdência pública que proteja efetivamente o servidor. E é impossível você falar com o servidor para organizar um sistema previdenciário sério sem que se tenha um controle desses altos salários. Na verdade, nós não estamos culpando as pessoas que recebem. Elas são beneficiárias de um sistema legal, constitucional e normativo em todos os planos imperfeito. Não adianta a Constituição determinar teto, não adianta os administradores se esforçarem para organizar uma folha decente, que não tenha diferenças gritantes como essa, se os tetos todos são vazados.

ZH – Essa medida já valeria para os atuais ou só para os futuros servidores?

Tarso – Se nós não pudermos cortar o presente, aqueles beneficiários que recebem salários, aposentadorias e pensões absurdas hoje, nós vamos fazer daqui para a frente. Mas a minha intuição é de que é possível, inclusive, pelo menos, no teto atual, que é o salário de desembargador, que isso se contenha até para os presentes. E para o futuro, vou propor um teto de R$ 17 mil, que é o salário do governador. Se nós conseguirmos isso, vamos poder falar num sistema protetivo sério para os funcionários públicos e poder discutir com eles de cara aberta. Como é que o Estado vai chegar para os funcionários e dizer o seguinte: “olha, vamos fazer um sacrifício todo mundo aqui, contribuir mais para organizar a previdência”. Os servidores olham para o governante e dizem: “mas vem cá, vocês têm salários, aposentadoria, pensão de R$ 52 mil”. É absurdo. Então, vamos trabalhar nessa direção.

ZH – Como o senhor fará os futuros cortes?

Tarso – O futuro corte depende de uma interpretação do Judiciário. Por nós, apresentaríamos uma emenda constitucional, com vigência imediata, para que nenhum pagamento de benefício ultrapassasse o salário do governador.

ZH – Para todos os poderes?

Tarso – Para todos os poderes. Mas nós sabemos que isso é impossível porque todas as interpretações consideram esses direitos adquiridos. Na minha opinião, é possível separar hoje aquilo que é direito adquirido. Vamos supor que seja direito adquirido perceber até o teto do desembargador, mas o resto pode ser considerado, sim, como abuso de direito. Essa é uma situação. Uma outra situação é, daqui para diante, propor que qualquer aposentadoria que vier a ocorrer não passe do salário do governador, que é de R$ 17 mil.

ZH – Um servidor da ativa hoje, por mais que ganhe acima de R$ 17 mil, terá uma aposentadoria de no máximo esse valor?

Tarso – Não passaria disso nos valores de hoje. É claro que isso tem correção, de acordo com a inflação, no futuro, mas nos valores de hoje, sim. Essa é a posição que nós vamos defender. É isso que vamos remeter para a Assembleia.

ZH – Mas nem nesse momento se tem um entendimento entre Executivo e Judiciário sobre o teto. Como o senhor colocaria em prática a sua proposta?

Tarso – Temos respeito como sempre a qualquer decisão do Judiciário. Agora, a nossa proposta vai ser essa. Se isso aí no futuro vazar, bem, aí é uma decorrência do sistema constitucional do país que em última análise permite esse vazamento. Isso exige, também, na minha opinião, uma decisão do Congresso sobre esse assunto. Se tem abuso em todos os poderes, nós podemos remediar aquilo que é possível remediar. E repito: isso não é culpa dos desembargadores, dos juízes. É de um sistema constitucional imperfeito tratando dessas limitações.

ZH – A referência seria, então, o salário do governador?

Tarso – Isso permitiria que o parlamento controlasse a evolução da folha a partir do salário do governador. Veja que coisa positiva que se tem. Qualquer abuso que o governador cometesse a seu favor, ele estaria prejudicando todo o sistema. Um sistema que hoje permite que se tenha uma diferença de um para 80 (entre o maior e o menor salário). Se há pessoas que ganham R$ 52 mil, há pessoas que ganham salário mínimo regional. É um absurdo isso. Nós iríamos evoluir para um sistema que permitisse, a médio prazo, ter uma diferença de um por 20, o que já é um exagero. No poder público da Suécia, da Suíça e de outros países, isso não é mais do que um para 10, um para sete. Vamos ter de enfrentar essa situação.

ZH – Este é o início da reforma da previdência?

Tarso – Sim. É impossível que se discuta a reforma da previdência com seriedade, sem que se discuta um teto com seriedade. Se tem um salário de R$ 50 mil, isso faz com o governante perca credibilidade, o Estado perca credibilidade perante o seu funcionário.

ZH – O senhor já apresentou essa proposta para os outros poderes?

Tarso – Não. Estou com os técnicos do governo e secretários trabalhando nisso. No fim do mês, vamos remetê-la para a Assembleia.

ZH – Essa proposta vai passar pelo Conselhão?

Tarso – O Conselhão irá discutir a reforma da previdência, mas isso é uma coisa muito simples e não se trata de fazer inúmeras divagações. Tem um indicativo da Constituição que determina um teto, então, esse indicativo da Constituição tem de ser trazido para a Constituição Estadual.

ZH – O Estado não deveria ter dois tetos, como ocorre hoje?

Tarso – Não deveria. Nós deveríamos ter um teto na estrutura estatal nacional e regional. Agora, se a sociedade não se mobilizar e os governantes não enfrentarem o desafio, os furos continuarão.

ZH – Desde quando o senhor trabalha na ideia de reduzir o teto no Estado?

Tarso – Desde a campanha.

ZH – O senhor não teme que essa medida seja contestada?

Tarso – É natural que seja contestada e é compreensível que as pessoas queiram usufruir dessas vantagens porque elas estão acostumadas a esse sistema. Garanto que uma medida como essa será apoiada por 98% dos servidores e da população.

COMENTÁRIO DO BENGOCHEA - É LOUVÁVEL A MANIFESTAÇÃO DO GOVERNADOR TARSO. Entretanto, outros governadores tiveram a mesma idéia e iniciativa, mas foram barrados pelo desamparo da Justiça e inércia do Legislativo, cujos interesses parecem ser outros neste quesito. Vigora no Brasil uma ditadura dos corporativismos judicial e parlamentar que promove e é conivente com as alterações na constituição, as farras, os privilégios e a pagamento de salários fora do teto previsto em lei. Com isto o interesse público e os cofres públicos são reféns de reajustes discriminatórios, direitos adquiridos imorais e de interesses corporativistas.

Não vejo sucesso nesta iniciativa, salvo se uma grande massa de servidores do Executivo sairem às ruas em apoio ao Governador, para mobilizar a sociedade em favor da moralidade, da harmonia entres os Poderes de Estado, da saúde dos cofres públicos, e da validade dos princípios republicanos e democráticos.

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