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domingo, 20 de dezembro de 2015

NAS REDES SOCIAIS, FALA-SE MUITO, MAS POUCO SE ESCUTA



ZERO HORA 20 de dezembro de 2015 | N° 18391

PAULA MINOZZO


COM A PALAVRA


“Nas redes sociais, fala-se muito, mas pouco se escuta”


Os debates que cercam as novas mídias, com frequência, são sustentados por um certo deslumbre com a tecnologia. A psicóloga norte-americana Pamela Rutledge muda os rumos da discussão e foca o seu olhar e suas pesquisas no aspecto comportamental de um mundo conectado e multimídia. Diretora do Media Psychology Research Center (Centro de Pesquisa de Mídia e Psicologia), uma organização sem fins lucrativos, ela se propõe a entender e estudar o impacto das diferentes mídias e a maneira como as pessoas se relacionam, emocionam-se e aprendem por meio das novas tecnologias. Pamela é procurada pelos maiores e mais reconhecidos veículos de comunicação, como the New York Times, CNN e The Wall Street Journal, para analisar fatos do mundo digital. Em entrevista por Skype, ela defende educação e “etiqueta digital” para convivermos melhor nas cada vez mais polarizadas redes sociais – que, na sua visão, não tornaram as pessoas mais agressivas: – Apenas trouxeram à tona comportamentos que não víamos antes.

Sites de veículos de comunicação já pensam em restringir comentários nas notícias por causa da agressividade de quem comenta. Por que chegamos a esse ponto?

Há uma certa pretensão em achar que, de alguma forma, as pessoas raivosas surgiram com as redes sociais. Como se todos estivessem comportados, sentados no sofá de casa e, com o surgimento das redes sociais, tenham começado a se comportar mal – se você achar, claro, que certos comentários podem ser considerados mau comportamento. O que as redes sociais fizeram foi trazer à superfície todos os tipos de comportamentos que antes não víamos. Particularmente, momentos de agitação política, econômica ou social geram ansiedade, e as pessoas reagem de maneira muito emotiva.

O Brasil enfrenta uma crise política e econômica. O noticiário e as redes sociais tornaram-se pesados. Algumas pessoas criam até mesmo grupos para boas notícias. Esse momento de turbulência pode gerar mais raiva e ansiedade?

Durante um período de crise, a sensação de medo toma conta. Um dos comportamentos das pessoas quando sentem medo é expressar raiva e procurar outros que compartilham os mesmos sentimentos, para que elas não se sintam sozinhas. Ironicamente, isso traz uma sensação de segurança. Além disso, a raiva é expressada de formas distintas com base em cada cultura. Não sei muito bem como é com os brasileiros. Os britânicos, por exemplo, expressam suas emoções nas redes sociais de maneira diferente se comparado com os americanos. Os britânicos são mais contidos. Eu acho interessante quando dizem que a mídia traz apenas notícias ruins. Pois bem, são as notícias ruins que capturam a atenção do público, pois desafiam nossa sensação de sobrevivência e segurança. Notícias boas seriam um luxo. Em outras palavras, se há perigo, precisamos saber, para garantir a própria sobrevivência.

Com frequência, a imprensa noticia casos em que celebridades sofrem ataques racistas nas redes sociais. Tornar esses episódios públicos seria uma maneira de combatê-los? Até onde vai a liberdade de expressão?

Seria necessário primeiro fazer algumas ponderações sobre liberdade de expressão. Alguns diriam que é um direito pleno e incontestável e outros que há limites para esse direito. Aqui, tornou-se uma tendência falar em “politicamente correto”. Há uma forma de censura social que não está escrita em qualquer lugar. Você pode dizer algo na internet que não é necessariamente ilegal, mas pode ter outras consequências, como perder o emprego. Não há resposta definitiva. Eu sou sempre muito cautelosa quando há de se decidir quem define o que é correto. Quando alguém tem o poder de fazer isso, é muito difícil de reverter. Como americanos, consideramos liberdade de expressão um pilar. Há diversos argumentos para defender certas restrições, mas limitar o que alguém pode falar é muito sério. Ao mesmo tempo, os jornais são seduzidos por tópicos sensacionalistas, porque provavelmente terão mais leitura e audiência. Acontece que, quando se começa a enxergar muitas coisas negativas na imprensa tradicional, seja violência, comentários racistas, ou o que seja, coisas que ganham muita atenção, o público começa a pensar que isso é muito mais comum do que verdadeiramente é. É um problema quando esse tipo de atitude ou comportamento começa a parecer normal, como se fosse padrão. A imprensa precisaria lidar com isso, contextualizando a frequência desses comentários. É preciso dar a informação de que isso é uma minoria que faz. Temos que decidir, como sociedade, quais comentários queremos encorajar, e por isso, precisamos abordar esses acontecimentos de maneira responsável, e não simplesmente indagar: “Meu deus, o que vamos fazer?”.

E como seria a abordagem ideal? No caso mais recente aqui no Brasil, a atriz alvo dos comentários racistas aproveitou o espaço para falar com outras pessoas que sofrem com o preconceito, por exemplo.

O que ela fez foi muito bom, dizer que ela reconhece que o racismo existe, sem levar a questão para o lado pessoal. Em outras palavras, o que ela essencialmente fez foi dizer que o problema está em quem posta os comentários e é algo que precisamos mudar, seja acionando a polícia, ou qualquer que seja a solução, dependendo de como cada sistema funciona. Não vamos celebrar o fato de que esses comentários existam, mas precisamos apontar: sim, há pessoas que ainda fazem isso e é altamente destrutivo para a nossa sociedade. Deve-se ter cuidado na hora de abordar essas situações, porque, geralmente, tratar de maneira punitiva não funciona, apenas reprime. É necessária uma mudança de comportamento, e isso pode ser feito desarmando os agressivos, e não criando mais raiva.

E como desarmar os agressivos?

Você tira o poder de quem se comporta de maneira negativa apenas para chamar atenção ou gerar mais ansiedade nos outros. A intenção deve ser de tornar claro que o comportamento dessas pessoas é indesejável em uma sociedade. Elas estão querendo mostrar poder, então, que se tire esse poder. Elas querem ser ouvidas, reconhecidas. Querem fazer os outros sentirem-se mal. Comentários negativos são uma maneira de fazer bullying. E não é aconselhável ceder ou brigar com quem faz a agressão e a intimidação, porque isso valida o papel deles. A maneira de desarmar os agressivos é mostrar como esse comportamento é inaceitável, mas não necessariamente travar uma batalha direta com eles.

As pessoas se tornam mais valentes nas redes sociais?

As pessoas geralmente ficam mais corajosas quando estão em grupo e quando não estão face a face. Isso se aplica à fofoca e às redes sociais, só que no mundo digital, tudo se torna público. Esquecemos que esse tipo de comportamento sempre aconteceu, mas não tínhamos acesso ao que os outros falavam com tanta instantaneidade.

Tomando conhecimento desses comportamentos, estamos já em um movimento contrário, de mudança de mentalidade nas redes sociais? Há diversas campanhas, sejam de organizações ou espontâneas, para combater isso.

Tudo que fazemos nas redes sociais reflete como as nossas mentes mudaram em todos os cenários. Não nos tornamos pessoas diferentes nas redes sociais, o que acontece é que você toma consciência de outras pessoas que têm a mesma opinião. Desse modo, as pessoas podem se juntar e mostrar como isso é importante. Mas o que eu mais vejo nas redes sociais são as pessoas falando, mas não tendo a paciência para escutar. Elas não querem entender o ponto de vista dos outros, querem apenas tomar um partido, seja esse positivo ou não. E quando queremos mudar a opinião de alguém, não podemos nos referir a elas de uma maneira que se sintam na defensiva. É preciso ter a disposição para falar “essa é a minha opinião, qual é a sua? Vamos trabalhar juntos” sem precisar desistir do que você apoia e acredita. Ao mesmo tempo, você precisa abrir mão do posicionamento dogmático para que o outro lado não se sinta ameaçado. Muitas pessoas que uma vez já foram marginalizadas sentem a necessidade de fazer com que o outro lado se sinta mal pelo que foi feito. Vingança é uma maneira muito destrutiva para alcançar qualquer solução.

Os frustrados são os mais agressivos nas redes sociais?

Pessoas frustradas tendem a ser mais agressivas em qualquer ambiente. Frustração e raiva levam à agressividade. Por algum motivo, começamos a culpar as redes sociais, mas na verdade, a pergunta a ser feita é: por que essas pessoas estão com tanta raiva? Quais são as percepções que alimentam o racismo? Vamos olhar para o que causa esse medo e esse ódio.

Ainda temos pouca noção sobre a responsabilidade que vem com o uso das redes sociais? Da dimensão que qualquer conteúdo postado pode tomar?

Não sei se eu usaria a palavra responsabilidade. Eu acredito que as pessoas não entendem o poder das mídias e tecnologias sociais. E sim, elas são muito poderosas, de pessoa em pessoa a informação pode se espalhar, e nem sempre de maneira correta, como acontece naquela brincadeira do telefone sem fio. As pessoas estão soltas nas redes sociais sem qualquer tipo de educação digital. É um problema para nossas informações pessoais e para as nossas relações pessoais, já que as regras comportamentais que aprendemos online têm um equivalente offline. Passamos muito tempo ensinando comportamento moral para as crianças, mas não pensamos em ensinar as mesmas coisas no ambiente da internet. É fácil de compreender se alguém, em uma festa, decidisse ir embora porque encontrou alguém que não gosta. Mas no Facebook, continuamos a seguir pessoas desagradáveis, que nos causam raiva. Podemos estabelecer limites e deixar de seguir aquela pessoa, seja saindo do Facebook ou desfazendo a amizade. Há diversas alternativas, mas ainda não aprendemos que o comportamento nas situações cotidianas tem um equivalente para o mundo digital.

Restringir nosso feed apenas com o que é agradável não colabora para a criação de uma bolha? Não precisamos reconhecer outras opiniões para não nos apegarmos a um ponto de vista único?

É preciso fazer uma distinção entre as duas coisas. Eu não vou a festas para me informar. Eu acesso fontes de notícias. É a mesma coisa: se formos esperar que as notícias cheguem pelo Facebook, estamos tomando más decisões sobre as fontes que escolhemos para nos informar. O Facebook é um ambiente social, é para saber o que os amigos estão fazendo e compartilhar informações pessoais. As pessoas escolhem os amigos que têm mais ou menos as mesmas crenças, é um comportamento normal. Se você quiser se informar, é melhor escolher uma fonte de notícias em vez de ir a uma festa.

Mas as pessoas cada vez mais buscam suas notícias no Facebook, já que pelo feed elas podem ter tudo ao mesmo tempo: as fotos dos amigos e os links para as informações.

Acredito que essa tendência vai durar até um jeito melhor surgir. Voltamos a falar de educação midiática e digital. Avaliar as fontes das notícias e a qualidade da informação que chega até o usuário. A melhor forma de lidar com todas essas questões é ainda cedo, quando crianças. Isso inclui como encontrar e curar informações, como discernir o posicionamento do produtor do conteúdo. O simples fato de alguém ter curado algum tipo de informação significa que ele utilizou critérios próprios que considerou importantes. Entender como funciona a dinâmica da informação é essencial, deveria fazer parte do currículo escolar.

O escritor português José Saramago (1922 - 2010) disse em entrevista que, com o Twitter, estamos a um passo do grunhido. A psicóloga e pesquisadora Sherry Turkle também questiona nossa habilidade de conversar uns com os outros depois das tecnologias móveis. Mudamos nossa maneira de interagir?

Não concordo com nenhum deles. Evidências mostram que as mídias sociais são usadas de formas distintas. Ou seja, de acordo com a proximidade e intimidade dos relacionamentos. Não falo com a minha filha postando no seu mural do Facebook, por exemplo. Nos ligamos, ou mandamos mensagens de texto, o que é algo muito mais pessoal. As mídias sociais nos permitem conectar com outras pessoas que estavam fora do nosso círculo de influência, como um amigo da escola primária. Com o Facebook, conectamos com as pessoas com as quais queremos validar alguma experiência que fez parte das nossas vidas. E isso é muito significativo. Não significa que aquela pessoa é seu novo melhor amigo, mas aquele contato tem muito valor. Para as pessoas que consideramos próximas, como amigos ou família, iremos sempre tentar conversar e nos reunir pessoalmente. Trocar informações e mensagens superficiais faz com que compreendamos melhor a vida dos outros. O discurso de que por causa de 140 caracteres não sabemos mais nos comunicar não considera as maneiras diferentes com que usamos as tecnologias. As redes sociais não estão nos tornando mais fúteis ou insensíveis, pelo contrário: nos tornaram mais conscientes sobre o resto do mundo.

O Facebook disponibilizou um avatar com as cores da França após os ataques em Paris. No Brasil, começou uma grande discussão nas redes sociais, pois alguns diziam que se prestava mais atenção aos acontecimentos de fora do que a tragédia de Mariana, no interior de Minas Gerais. Como lidamos com tragédias nas redes sociais?

Tragédias, seja um ataque terrorista ou um tufão, são sempre assustadoras. É algo não planejado, então, a primeira coisa que as pessoas fazem é decidir o quão relevante é aquilo para elas. Instintivamente, elas questionam se estão em perigo. Uma das razões para Paris receber tanta atenção é porque todos conhecem a cidade, seja por filmes, viagens, ou pela sua reputação. Paris é uma cidade icônica. No mesmo período, algumas tragédias similares ocorreram no Oriente Médio, mas esses ataques terroristas não receberam atenção nos Estados Unidos, em parte, porque não tínhamos como nos relacionar com aquilo. É por isso que vimos muita empatia por Paris, porque temos essa conexão emocional, como se todos nós conhecêssemos a cidade.

É a conexão emocional que faz com que a gente publique qualquer coisa nas redes. Isso explicaria por que algumas pessoas ficam tristes se não recebem curtidas nos seus posts?

Você simplesmente gosta de receber curtidas ou vai ficar triste se não recebê-las? Uma coisa não implica a outra. Nos sentimos bem com a validação social. Ativa neurotransmissores no nosso cérebro. Conexão social é muito importante para a nossa sobrevivência. Há pessoas que dependem demasiadamente de validação externa? Que talvez se importem com algumas coisas de uma maneira que não é saudável? Sim, mas, primeiro de tudo, isso é uma minoria. Segundo, esse comportamento vai se manifestar nos demais aspectos da vida.

As selfies são uma expressão desse comportamento que busca validação social?

Selfies são muito importantes para nós, porque, pela primeira vez, podemos controlar nossa própria imagem. Nos permitem tirar a pressão que envolve fazer um retrato e nos dão o controle de compartilhar nossa imagem como preferirmos. Uma parte disso também é conectar com os outros, porque nada é tão poderoso quanto uma imagem. Quando se vê a imagem de alguém, mesmo que estática, há uma quantidade grande de informação sobre aquela pessoa. Consegue-se enxergar dentro dos seus olhos. É possível ver o que tem ao fundo. Eu poderia enviar texto e demoraria quase o mesmo tempo, mas se eu enviar uma selfie de algum lugar, vou passar a emoção, o cenário, o contexto, como estava o dia.

E a obsessão por registrar? Críticos e artistas já se manifestaram contra essa mania de gravar um show inteiro, por exemplo.

Esse é um ponto de vista bastante elitista. Ninguém tira fotos durante todos os momentos do show, o que as pessoas fazem é documentar algo que é importante para elas, para que, logo mais, elas possam reviver aqueles momentos. Se você é um crítico de música, você vai a muitos desses eventos. O público, não.

Sobre o fenômeno dos YouTubers: por que eles se tornaram tão influentes? Alguns são pessoas comuns que compartilham a própria vida e ganham legiões de fãs.

As pessoas, inerentemente, são interessadas pela vida dos outros. Assistir à vida de alguém é interessante. Por ser uma pessoa verdadeira, você começa a se engajar com aquilo, criar uma relação com aquele pequeno mundo. O problema para a maior parte dos YouTubers é que é preciso disposição para dedicar tempo para manter uma presença no YouTube. Eles podem se tornar muito populares e, em alguns casos, muito lucrativos, mas não é duradouro. Não é algo construído em cima de uma habilidade, por isso não é duradouro. E, quando começa a entrar muito dinheiro, começam os questionamentos sobre a autenticidade. Com as celebridades, ainda que queiramos ser como elas, compreendemos que, se a Angelina Jolie está usando um relógio em uma propaganda, alguém esta pagando muito dinheiro para que ela faça isso. Em um vídeo do YouTube, essa pessoa pode usar quatro relógios, mas vai dizer de qual deles ela mais gosta, e então você supõe que aquilo é autêntico. O próximo passo do YouTube serão os questionamentos sobre a autenticidade. É como o caso da menina na Austrália que desistiu das redes sociais depois de revelar que era paga para usar todas aquelas coisas (Essena O’Neill, a modelo e celebridade no Instagram que mostrou a verdade por trás das fotos que publicava).

Para dar certo na internet, é preciso ser autêntico?

A internet sempre vai se alimentar e prosperar com o que é autêntico. Mas algumas pessoas podem perder essa autenticidade se não tomarem cuidado. A partir de certo ponto, se elas viram apenas garotos-propaganda, é importante que digam: “Estou abrindo essa lata de sopa porque enviaram para mim, mas vou provar para ver se realmente gosto”. É essa autenticidade que vai fazer o poder permanecer.

Essa busca pela autenticidade fez com que uso do Photoshop e softwares de edição fossem malvistos? Quando uma celebridade é pega usando, recebe muitas críticas nas redes sociais.

Ninguém gosta de ser enganado, e agora temos a chance de ver o mundo como ele é, sem precisar de marqueteiros. É por isso que fotos de celebridade sem maquiagem ou no supermercado têm tanta visibilidade, porque as pessoas querem ver o que é verdadeiro.

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