Revelamos aqui as causas e efeitos da insegurança pública e jurídica no Brasil, propondo uma ampla mobilização na defesa da liberdade, democracia, federalismo, moralidade, probidade, civismo, cidadania e supremacia do interesse público, exigindo uma Constituição enxuta; Leis rigorosas; Segurança jurídica e judiciária; Justiça coativa; Reforma política, Zelo do erário; Execução penal digna; Poderes harmônicos e comprometidos; e Sistema de Justiça Criminal eficiente na preservação da Ordem Pública e da incolumidade das pessoas e do patrimônio.

segunda-feira, 18 de março de 2013

AMEAÇAS À LIVRE OPINIÃO


O Estado de S.Paulo 18 de março de 2013 | 2h 09


OPINIÃO


A liberdade de imprensa "continua sendo minada por governos autoritários e intolerantes que aumentam e reinventam as formas de perseguição ao jornalismo", relata o documento final da Reunião de Meio de Ano da Sociedade Interamericana de Imprensa (SIP). Realizado em Puebla, no México, com representantes de empresas jornalísticas sediadas em 21 países americanos, entre os quais o Brasil, o encontro foi concluído com a denúncia de "uma violência que parece não ter limites", praticada contra jornalistas do continente. Representando o presidente mexicano na cerimônia de encerramento, o secretário de Educação mexicano, Emílio Chuayffet, comentou o fato com uma sentença reveladora das consequências nefastas desta constatação na vida institucional das nações: "Agredir um jornalista é agredir toda a sociedade".

O relatório semestral da SIP relaciona oito países americanos nos quais os profissionais dos meios de comunicação estão expostos a grandes riscos: Argentina, Equador, Venezuela, Bolívia, Cuba, Honduras, Nicarágua e Panamá. O documento destaca o uso, por presidentes autoritários, de uma arma contra quaisquer veículos de opinião que os contrariem: o boicote oficial que pressiona empresas privadas a retirarem anúncios dos meios independentes. Isso ocorreu no Peru no passado. E agora se repete na Argentina de Cristina Kirchner, onde grandes anunciantes suspendem campanhas publicitárias temendo represálias tributárias. Por isso, adverte o documento, "o jornalismo crítico corre o risco de não sobreviver".

A advertência da entidade foi divulgada na data em que se anunciou para depois das eleições presidenciais de 14 de abril na Venezuela a venda da emissora Globovisión, a única crítica implacável do governo de Hugo Chávez. O comprador será Juan Domingo Cordero, sócio da seguradora La Vitalícia e tido como próximo do presidente chavista da Assembleia Nacional, Diosdado Cabello. Embora não haja ligação explícita entre ele e o chavismo, a futura venda do canal foi comemorada efusivamente por Andrés Izarra, ex-ministro de Comunicações e atual integrante da cúpula da campanha do candidato oficial à sucessão de Chávez, Nicolás Maduro. Izarra festejou: "a TV será roja-rojita" (vermelha-vermelhinha), a cor bolivariana.

A família Zuloaga, acionista majoritária da empresa controladora do canal, divulgou carta em que afirma que, se for mantido o atual comando, o veículo "é inviável jurídica e financeiramente". Os atuais donos se queixam de ameaças de fechamento e do assédio legal do governo da Venezuela, que lhes impõe dificuldades burocráticas e multas permanentes. Não tem sido permitido também ao grupo receber dólares preferenciais estatais para comprar equipamentos, como fazem os concorrentes. Na carta, Guillermo Zuloaga relatou que o grupo fez de tudo para ajudar a eleger um opositor nas eleições presidenciais do ano passado, mas a vitória de Chávez pôs a concessionária numa situação definida como "muito precária como canal e como empresa". Como a concessão do canal expira em dois anos, a família proprietária tomou a decisão de vendê-lo diante da perspectiva concreta de não haver a renovação. Zuloaga está foragido da Venezuela desde 2010, acusado de "usura genérica" por suposta especulação na venda de carros. Os 20% de ações pertencentes a Nelson Mezerhane estão congelados, em litígio, desde que o governo liquidou um banco de propriedade desse empresário.

Brasil e México não fazem parte da relação dos oito países com maior risco para a opinião livre em meios de comunicação. Mas os representantes brasileiros se queixaram da censura judicial, da impunidade e da lentidão da Justiça, além de terem mencionado a morte de dois jornalistas.

E o Zócalo, jornal do Estado de Coahuila, na fronteira mexicana com os Estados Unidos, informou, na ocasião da divulgação do documento da SIP, que deixará de publicar reportagens sobre cartéis de drogas locais, por faltar segurança para "o exercício pleno do jornalismo". Em editorial de primeira página, o Conselho Editorial do veículo atribuiu a decisão "à responsabilidade de zelar pela integridade e pela segurança" de seus funcionários.

terça-feira, 12 de março de 2013

RISCO DE DITADURA PARTIDÁRIA

O ESTADO DE SÃO PAULO 12 de março de 2013 | 2h 08


Sebastião Ventura P. da Paixão Jr. *


Para os políticos tacanhos, o poder é tudo. E pelo poder, pensam que tudo podem. No entanto, sabidamente, ninguém pode tudo. Por maior que seja a ganância ou o abuso, sempre chega o dia em que a vida, por seus puros raios de sol, desmascara a mentira dos ímpetos absolutistas de perpetuação no poder. Infelizmente, após longos anos de arbítrio institucionalizado, o Brasil volta a viver dias inquietantes. Com uma oposição disforme e apática, associada a uma clara estratégia governista de ampliar - a todo custo - a base de sustentação entre amigos e parasitas, alguns filhotes soviéticos elegeram o inimigo da hora: a imprensa livre.

Sem cortinas, os malsinados projetos de regulamentação da mídia representam a última etapa de uma degenerativa pauta de dominação política e castração dos setores críticos da sociedade civil. Numa democracia ideal, cabe ao Parlamento ser a instância de fiscalização e controle político de eventuais desvios palacianos. No entanto, nosso Congresso Nacional passa por grave crise ética e moral; além de lideranças opacas, os srs. congressistas nem sequer realizam funções basilares, como votar tempestivamente os vetos presidenciais. É lamentável, mas os fatos estão aí e falam por si. Resta saber - se não for pedir muito - o que os eminentes parlamentares brasileiros fazem na árdua rotina de trabalhos de terça a quinta-feira...

Indo adiante, cabe registrar que a tentativa de imposição de métodos inquisitórios de controle da imprensa e da livre circulação da informação não vem de hoje, nem de ontem. Em breve corte histórico, é oportuno lembrar que Rui Barbosa foi impedido de publicar, no periódico Imparcial, discurso proferido na tribuna do Senado contra ato do governo federal, que prorrogava, por mais seis meses, um abusivo estado sítio. Contra a arbitrária proibição, o excelso brasileiro impetrou habeas corpus perante a colenda Suprema Corte, que, em sessão de 6 de maio de 1914, veio a conceder a ordem ao impetrante, assegurando o "seu direito constitucional de publicar os seus discursos proferidos no Senado, pela imprensa, onde, como e quando lhe convier". Como se vê, o tempo passa e certos desideratos totalitários de controle da imprensa insistem em permanecer no breu.

No caso atual, temos uma agravante considerável: a covardia oposicionista no desempenho de sua função crítica aos descaminhos do governo. Aliás, temos uma oposição que estava muito acostumada a ser maioria e, assim, parece ter esquecido o calor das lutas diárias que a democracia responsável impõe aos altos representantes da minoria. Ao olhar para a letargia da atual oposição brasileira, a lembrança joga luzes sobre a cirúrgica observação do então senador Paulo Brossard: "Nada como uma passagem pela oposição para refazerem-se os partidos que conheceram, por muito tempo, as intimidades do poder". Tais palavras foram ditas em discurso de 25 de abril de 1975 e ainda ecoam, com energia, na memória dos discípulos do saudoso Partido Libertador.

O fato é que o silêncio e a falta de uma atuação orgânica da oposição brasileira sobrecarregam o papel institucional da imprensa. Além de uma instância de livre circulação de ideias e acontecimentos, o jornalismo - na busca incessante pela imparcialidade e pela verdade factual - é transformado em pedra no sapato da política rasteira. E como a política rasteira é parcial em seus interesses de ocasião, os imparciais do jornalismo independente são demonizados como se estivessem a fazer um desserviço ao País, informando segredos de Estado que não poderiam tornar-se públicos. Ora, quem teme a publicidade já revela um desapreço republicano; se a coisa é pública, é porque, regra geral, deve estar aos olhos de todos. Afinal, a honestidade não gosta de disfarces. É justamente por isso que a estrada da ocultação nunca levou a democracia a seus melhores destinos. Logo, quanto maior a visibilidade pública, menor o risco de usurpação das instituições republicanas.

Nos regimes de liberdade constitucional, a imprensa deve ser necessariamente livre para bem informar a coletividade. Como um dia disse Raul Pilla, democracia é mais que eleições, democracia é governo segundo a opinião pública. Nesse sentido, além de uma oposição atuante, o espírito democrático pressupõe uma imprensa liberta e sem peias. O bom governo é aquele que age de olhos abertos, respeita o pluralismo social e não teme o livre exercício do direito de crítica, decorrente da inderrogável garantia maior da liberdade de expressão. Quem se quer incriticável jamais será um democrata modelar; poderá ser um democrata fantasiado ou um democrata fanfarrão, mas nunca será um autêntico democrata, na legítima expressão da palavra. É hora, portanto, de a sociedade voltar a falar sem medo e dizer "não!" àquilo que mal está. Para tanto a oposição deverá lamber suas feridas, firmar o passo, unir suas lideranças e voltar a trabalhar ativamente pelo bem do Brasil.

O risco atual não é a ditadura política, mas a "ditadura partidária" e a consequente supressão de uma saudável e necessária rotação dos partidos no poder. Se isso vingar, as eleições não passarão de um jogo de cartas marcadas em favor dos candidatos oficiais, anulando-se a imperativa dialética dos regimes democráticos. Aqui chegamos a um ponto de estrangulamento do atual sistema político brasileiro: ou a oposição reaglutina forças, unidade e coesão, ou será patrolada, impiedosamente, pela máquina eleitoral desta insaciável situação.

O momento não comporta mais amadorismo nem briga de vaidades; se existiram erros no passado, é preciso seguir em frente, levantar a cabeça e voltar a pensar o futuro da Nação. Os desafios são possíveis de enfrentar, mas não são fáceis. E se fossem fáceis, talvez não fossem tão desafiadores.

Será muito, então, pedir uma oposição una, combativa e voltada para os melhores interesses da Pátria?


* Sebastião Ventura P. da Paixão Jr. é advogado.

segunda-feira, 11 de março de 2013

O PAPEL DE CADA UM

FOLHA.COM 11/03/2013 - 03h30


Ela Wiecko


A separação e a distinção de funções servem à racionalidade no exercício do poder. Os Estados se organizam a partir de três funções básicas: legislar, administrar e julgar, que correspondem aos Poderes Legislativo, Executivo e Judiciário.

Assim, ao Legislativo cabe elaborar as leis; ao Executivo, executá-las e ao Judiciário, julgar as controvérsias sobre a aplicação das leis.

Mas, embora o Legislativo preponderantemente se ocupe de elaborar as leis, também exerce atribuições de outros Poderes, quando apura condutas por meio de comissões de inquérito ou quando processa e julga determinados agentes políticos.

O Executivo também legisla, por meio de medidas provisórias, e mantém órgãos que julgam a conformidade de certas condutas à lei.

Por vezes, tribunais têm competência normativa, estabelecem e executam políticas administrativas.

Essa reflexão vem a propósito de uma distinção que começou a ser disseminada, como se fora garantia democrática, de que a polícia investiga, o Ministério Público acusa e o Judiciário julga.

Em primeiro lugar, com intensidade maior ou menor, as três instituições, de alguma forma investigam, acusam e julgam. Polícia e Ministério Público julgam quando deixam de apurar no inquérito policial ou em juízo, respectivamente, a prática de infrações penais. Ao Judiciário, compete promover a apuração de crimes imputados a seus membros.

Visca/Folhapress



Em segundo lugar, investigar e acusar se confundem na prática. Isso porque investigar ou apurar implica averiguar, empenhar-se em descobrir a autoria de uma conduta e as circunstâncias a ela relacionadas. Essa apuração, quando é feita pela polícia, resulta num juízo sobre a conduta de uma pessoa: cometeu ou não cometeu um fato ilícito. Se cometeu, ela é indiciada, o que equivale a uma acusação.

De sua parte, a atuação do Ministério Público no processo penal não se resume a acusar, no sentido de imputar a alguém uma falta, um erro, um crime. Precisa fazer mais: precisa fazer prova em juízo, o que nada mais é do que uma apuração, uma investigação.

No processo penal, o importante é distinguir as funções de acusar, defender e julgar, características do sistema acusatório. Essa é a inovação trazida pela Constituição de 1988, que aboliu o sistema inquisitivo e exigiu a releitura e alterações do Código de Processo Penal.

Atende à racionalidade do poder punitivo distinguir a fase de investigação pré-processual da fase de investigação processual e atribuí-las a órgãos diversos. Essa é a regra, que não pode, porém, transformar-se em cabresto para o órgão que tem a função de "promover, privativamente, a ação penal pública, na forma da lei" (art. 129, I).

Se o Ministério Público não puder apurar uma conduta que não tiver sido apurada pela polícia ou tiver sido deficientemente apurada, ficará comprometida a função de acusar.

A Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 37, a pretexto de pacificar controvérsias que foram criadas artificialmente, estará violando o princípio constitucional do pluralismo político (art. 1º, V), pois estará reduzindo as alternativas do Estado brasileiro em dar resposta efetiva a violações a direitos fundamentais definidas em lei como crimes.

A expressa competência privativa conferida à polícia para apurar infrações penais concentra numa instituição, cujos integrantes não gozam de independência funcional nem das garantias de vitaliciedade, inamovibilidade e irredutibilidade de subsídios, o poder de selecionar quem poderá, ou não, vir a ser definido em juízo como criminoso.

Não é, certamente, o que deseja a sociedade brasileira.

ELA WIECKO é subprocuradora-geral da República e ouvidora-geral do Ministério Público Federal


domingo, 10 de março de 2013

QUEM GOVERNA QUEM GOVERNA?




ZERO HORA 10 de março de 2013 | N° 17367 ARTIGOS

AYRES BRITTO*


Comecemos por uma afirmação óbvia: o Poder Executivo de qualquer das quatro unidades da nossa federação tem um chefe. Estrutura-se ele, Poder Executivo, sob a chefia ou autoridade máxima de um agente político. Prefeito, governador, presidente da República, todos dirigem superiormente uma dada Administração Pública e daí se postam aos olhos do povo como a própria encarnação do governo. A face mais visível do poder público.

Estamos a falar, portanto, de um tipo de agente que é popularmente eleito para ficar no topo de um dos poderes elementares do Estado. Poder, esse, mais fisicamente próximo do conjunto da população, por lhe competir implementar as políticas públicas mais cotidianamente significativas dos interesses e valores juridicamente qualificados como próprios dessa população mesma. Interesses e valores que mais de perto viabilizam a sobrevivência, o equilíbrio e a evolução do conjunto da sociedade, por conseguinte. Donde a instantânea identificação entre chefe do Poder Executivo e o governo de toda pessoa estatal-federada: União, Estados, Distrito Federal e municípios.

Pois bem, haveria alguém acima desse governante que é o chefe do Poder Executivo? Claro que não! Nenhuma pessoa física, nenhum outro agente público, ninguém, enfim, se coloca aos olhos do povo como acima daquela autoridade que já estampa, em sua unipessoalidade, o governo de todo um povo geograficamente diferenciado e juridicamente personalizado. Mas, se não existe alguém, existe algo. Esse algo superior aos próprios governantes é a Constituição.

Com efeito, a Constituição governa quem governa. Governa de modo permanente quem governa de modo transitório. Por isso que o termo de posse do próprio chefe do Poder Executivo federal, que é o presidente da República, se dá pela prestação do “compromisso de manter, defender e cumprir a Constituição”. Em sequência é que vem a promessa de “observar as leis, promover o bem geral do povo brasileiro, sustentar a união, a integridade e a independência do Brasil” (art. 78, cabeça, da nossa Magna Carta Federal).

Não pode ser diferente. A Constituição é o mais estrutural, o mais abrangente e o mais permanente projeto de vida nacional. Para além de se traduzir na Lei Fundamental do Estado e de todo o povo brasileiro, ela é a Lei Fundamental da própria nação igualmente brasileira. Sabido que a nação, por ser a linha invisível que faz a costura da unidade entre o passado, o presente e o futuro, é instituição que tanto engloba o povo de hoje como o povo de ontem e o povo de amanhã. Logo, à semelhança de cada família em apartado, nação é um misto de ideia e sentimento que faz a contemporaneidade caminhar de braços dados com a ancestralidade e a posteridade (“A pátria é a família amplificada”, bem sentenciou Rui Barbosa).

Ora bem, sendo obra dessa realidade atemporal que é a nação, a Magna Carta Federal exprime uma vontade transgeracional. Que já é a vontade mais qualificadamente coletiva, no sentido de que unifica história e geografia do Brasil por todo o tempo. Vontade coletiva permanente, então, a se impor à vontade transitória dos governantes que se sucedem a cada eleição geral.

Diga-se mais: a Constituição é comando pra valer. Ela cuidou de se fazer imperativa e para isso é que habilitou os cidadãos e instituiu órgãos como os Tribunais de Contas e o Ministério Público para saírem em defesa da sua irrestrita aplicabilidade. Ao lado deles, e como instância derradeira de sua autodefesa, a nossa Lei Maior apetrechou o Poder Judiciário. Não que ele, Poder Judiciário, fosse aquinhoado com a função de governar. Não é isso. Mas, se não tem do governo a função, o Judiciário tem do governo a força. A força de impedir o desgoverno. O desmando. A desordem. Desgoverno ou desmando ou desordem tanto mais intoleráveis quanto resultem do desrespeito à Constituição.

Em suma, só há governabilidade legítima nos marcos da Constituição e das leis, nessa ordem. Fora desses marcos de civilidade jurídica, o que se tem já é puro arbítrio. Autoritarismo, e não autoridade. Uma predisposição para sequenciar o promíscuo jogo do vale-tudo político-partidário, ou político-parlamentar, ou político-empresarial. Ou as três coisas juntas, para maior desgraça da nossa qualidade de vida política. Essa qualidade de vida política a que aspiramos como a primeira das nossas afirmações coletivas.


*MINISTRO APOSENTADO DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL E POETA

COMENTÁRIO DO BENGOCHEA - Seguindo ensinamentos de Hely Lopes Meirelles, o Poder Executivo não governa sozinho na clássica tripartição de Montesquieu adotada na Constituição da República Federativa do Brasil. O Estado é constituído pelo Povo, Território e Governo Soberano. A vontade estatal se manifesta nos três Poderes de Estado: Executivo, Legislativo e Judiciário, independentes e harmônicos entre si, desempenhando ações conjuntas e papéis que se complementam e interagem na governança do Estado. O Poder Executivo governa convertendo a lei em ato individual e concreto (função administrativa), o Poder Legislativo governa elaborando as leis (função normativa) e o Poder Judiciário governa aplicando as leis com coatividade (função judicial). Um dos maiores erros neste País é jogar a responsabilidade de Estado e do Governo apenas ao Poder Executivo, desprezando os deveres de Estado do Legislativo e do Judiciário.

A Justiça Criminal é o maior exemplo de uma governança separada, corporativa e divergente exercida no Estado brasileiro. Leis são elaboradas e nem sempre executadas e,ou aplicadas. O culpa pelo caos prisional é jogada no Poder Executivo que faz a guarda e a custódia dos apenados da JUSTIÇA, enquanto o Judiciário sentencia, determina o regime penal, controla as penas, supervisiona a execução penal, concede benefícios e solta. As forças policiais e penitenciárias são administradas pelo Executivo e desprezadas pelo MP e Judiciário, apesar delas auxiliarem a justiça com o poder de polícia e o poder da guarda e custódia de presos à disposição do Judiciário.

O que estão fazendo os Poderes Legislativo e o Judiciário diante do retrabalho policial no combate ao crime e da inércia do Executivo em construir presídios para ressocializar os apenados da justiça? Ao ficarem elaborando leis benevolentes e soltando a bandidagem, demonstram atitudes próprias de quem não se vê como governo responsável pela pela ordem pública e paz social.

sábado, 9 de março de 2013

NO SE CALLÓ

ZERO HORA 09 de março de 2013 | N° 17366

INFORME ESPECIAL | TULIO MILMAN


Hugo Chávez fala depois de morto. Fala alto, grita.

O frenesi gerado pelas exéquias do líder bolivariano é um tratado sobre a Venezuela e sobre a América Latina. Milhões de pessoas esperando 12 horas na fila. Essa é a moldura. O fato se alimenta em raízes profundas e antigas que bebem no nosso jeito de ser. Hugo Chávez construiu elos inquebráveis com grande parte das massas populares do seu país. A receita é antiga, mas ainda funciona:

1. Escolha um inimigo poderoso.

2. Faça o povo pensar que ele está no centro da ação política.

3. Discurse por horas a fio.

4. Mitifique-se.

5. Mude a lei para se manter no poder.

Chávez e o chavismo são uma luz vermelha para a democracia.

E democracia não é sinônimo de voto. São inúmeras as ditaduras que se camuflam promovendo pseudoeleições. No Brasil, mesmo no período mais crítico do regime militar, o povo era autorizado a escolher entre a Arena e o MDB. Desde que a Arena ganhasse.

Democracia se faz com instituições fortes, independentes, combativas. Judiciário, Parlamento, Imprensa, Ministério Público, Defensoria, Partidos Políticos. Todos com letras maiúsculas.

Projetos de poder alicerçados em semideuses são apenas atestados de incompetência e de atraso. E se alguém achava que Hugo Chávez se calaria depois de morto, uma má notícia: o rei Juan Carlos, da Espanha, que ainda está vivo, vai se calar antes dele.


*Com Gabriele Branco



segunda-feira, 4 de março de 2013

IRRELEVÂNCIA DOS ASSUNTOS ESTRATÉGICOS


'Ministério do futuro' ilustra lamentação peemedebista. Sigla usa 'irrelevância' da Secretaria de Assuntos Estratégicos para pedir mais cargos no governo

LUCIANA NUNES LEAL /RIO - O Estado de S.Paulo, 04/03/2013


Em época de articulação dos partidos para as mudanças nos ministérios da presidente Dilma Rousseff, a Secretaria de Assuntos Estratégicos (SAE), ocupada pelo ex-governador do Rio e ex-deputado Wellington Moreira Franco, é o símbolo da insatisfação do PMDB com os cargos no primeiro escalão. Sem potencial eleitoral, ele é chamado às vezes de "ministério do futuro": faz estudos sobre temas diversos e produz propostas de políticas públicas, mas não executa as ações e acaba ofuscada pelos ministérios executores.

"O produto que temos a oferecer é seminário e seminário não elege ninguém", diz Moreira Franco, depois de enumerar uma série de projetos em andamento na SAE - cujo orçamento, para 2013, é de R$ 26,5 milhões. A agenda do ministro no último ano mostra, de fato, uma série de palestras, mesas redondas e seminários, encontros com diplomatas e visitantes estrangeiros e seis viagens internacionais (Bruxelas, Santiago, Madri, Estocolmo, Genebra e Seul). Nada de inauguração ou audiência com Dilma.

A queixa no PMDB não é com as funções do ministério, mas com sua falta de peso político. "Chamar a SAE de ministério é piada. A diferença entre o status de ministério da SAE e sua real dimensão é a mesma entre o poder que acham que o PMDB tem e o que o partido tem na prática", diz o líder do partido na Câmara, Eduardo Cunha (RJ).

A SAE é apenas um exemplo. Os peemedebistas têm-se queixado por terem cinco ministérios, mas nenhum deles de grande expressão. E, para decepção de muitos, no sábado a presidente Dilma, convidada da convenção do PMDB, em Brasília, fez seguidos elogios ao partido e a seu líder, o vice-presidente Michel Temer - mas nada falou sobre repetir com ele, em 2014, a dobradinha PT-PMDB.

Participar. "A SAE poderia ser um belo instrumento se participasse de fato da formulação. O que importa é a missão política que se dá ao cargo. Não vamos brigar por ministério, mas para participar das decisões. O ministério do Gilberto Carvalho (chefe da Secretaria-Geral da Presidência da República), por exemplo, não executa ações mas é ouvido", comparou Cunha.

Ligado ao vice-presidente Michel Temer e representante do PMDB na campanha de Dilma em 2010, Moreira evita comentar o prestígio da pasta. Prefere destacar os seus focos de atenção - primeira infância, sustentabilidade da classe média, estímulo ao investimento em florestas plantadas. O ministro tem profissionais experientes sob seu comando. O economista Ricardo Paes de Barros, um dos maiores especialistas no estudo da pobreza, é o secretário de Ações Estratégicas. O ex-presidente da Embrapa Pedro Arraes assumiu a Secretaria de Desenvolvimento Sustentável. A SAE também abriga o Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), para onde Moreira levou Marcelo Néri. "A maneira mais clara de mostrar a nossa contribuição seria ter um projeto de lei com começo, meio e fim na SAE. Mas, na maioria das vezes, nem sempre a contribuição fica visível", diz Paes de Barros.

O secretário comandou os estudos sobre a primeira infância que contribuíram para o Brasil Carinhoso, do Ministério de Desenvolvimento Social. Ele dá exemplos de sucessos e frustrações da secretaria. "A SAE colocou esta questão da primeira infância desde o primeiro dia do governo. O gráfico que introduz o Brasil Carinhoso e mostra que a pobreza das crianças era o dobro da média brasileira foi produzido na SAE. Também chamamos atenção para a importância do desenvolvimento psicossocial das crianças, o que gerou mudanças na caderneta das crianças, que deixou de ser só de saúde, mas de desenvolvimento", afirma Paes de Barros.

No desenvolvimento sustentável, um dos projetos em curso é o de estímulo ao investimento em florestas plantadas. Ainda não está claro qual ministério assumirá o tema como política pública - os candidatos são Agricultura, Meio Ambiente, Desenvolvimento Econômico e Fazenda. "Nós cobrimos lacunas que os ministérios não têm condições de resolver. Na questão das florestas plantadas, ainda não sabemos em que ministério vai ficar. Se for um filho bonito, pai não vai faltar", brinca o secretário Pedro Arraes.

sexta-feira, 1 de março de 2013

O PODER DA PRESSÃO

ZERO HORA 01 de março de 2013


Diante de tais fatos, parece não haver dúvida de que a liberdade de expressão, potencializada pelo acesso das pessoas às novas tecnologias de comunicação, fortalece a cidadania.


Sob o protesto isolado do deputado mineiro Newton Cardoso (PMDB), a Câmara Federal aprovou na última quarta-feira projeto do Senado que retira o 14º e o 15º salários dos parlamentares. Na ocasião, o ex-governador de Minas discursou enfurecido contra seus pares: "Estão votando com medo da imprensa, é uma deslealdade com deputados que precisam (dos valores). Eu não falo aqui pelo PMDB, eu não falo aqui em nome de nenhum partido, eu falo aqui em nome daqueles que não têm coragem de falar. Estou nesta Casa há três mandatos, e não recebo nada. Agora, essa verborragia, essa lenga-lenga, isso de dizer que os deputados não precisam de 14º salário é errado". Talvez até precisem, mas certamente a maioria dos trabalhadores brasileiros precisa muito mais. Como o país não pode proporcionar tal regalia a todos, não há por que favorecer apenas os parlamentares. Simples assim. Ao alinhar-se pelo fim desse privilégio, a imprensa apenas refletiu o pensamento do público, que também vem sendo manifestado inequivocamente nas redes sociais. Pode parecer uma lenga-lenga para o deputado mineiro, mas é, na verdade, uma forma de pressão legítima e democrática sobre governantes, homens públicos e autoridades.

Mobilização virtual semelhante levou o contestado presidente do Senado, Renan Calheiros, a se comprometer com medidas de austeridade e transparência no início de seu mandato. Pressionado pelo abaixo-assinado online que pede seu impeachment, o senador alagoano procurou reconquistar a simpatia do eleitorado, anunciando medidas administrativas de enxugamento de custos, que já foram inclusive aprovadas pela Mesa do Senado. Entre as principais mudanças, estão a extinção de funções de chefia e assessoramento, a ampliação da jornada de trabalho dos servidores, o corte de regalias para atendimento médico e laboratorial, criação de conselhos de transparência e controle social, divulgação de proventos e pensões de ex-servidores e várias outras destinadas a reduzir gastos desnecessários e a manter os cidadãos informados. A providência é mais do que oportuna, considerando-se que os parlamentares brasileiros são os segundos mais caros do mundo entre 110 países pesquisados pela ONU.

Diante de tais fatos, parece não haver dúvidas de que a liberdade de expressão, potencializada pelo acesso das pessoas às novas tecnologias de comunicação, fortalece a cidadania. Certamente merece ressalva o fato de o Legislativo ser o poder mais exposto à fiscalização dos cidadãos e também o mais suscetível a pressões, uma vez que os parlamentares dependem da reiterada aprovação dos eleitores para se manter em seus cargos. Mas também os demais poderes, assim como autoridades, servidores públicos e mesmo setores privados, têm demonstrado sensibilidade em relação a mobilizações populares e campanhas articuladas pelas redes sociais. Até mesmo ditaduras cedem diante desta nova força de comunicação, como se viu recentemente na chamada primavera árabe, que derrubou déspotas encastelados no poder há décadas.

Então, por que não usá-la para aperfeiçoar a democracia e combater a corrupção?