ZERO HORA 22 de novembro de 2013 | N° 17622
EDITORIAIS
Depois da questionável pirotecnia de viés eleitoreiro promovida pelo Planalto em torno da exumação do ex-presidente João Goulart, o Congresso Nacional promoveu um debate até a madrugada de ontem para anular a sessão do dia 2 de abril de 1964, que declarou vaga a Presidência da República e oficializou o golpe militar. A onda revisionista das instituições brasileiras começa a virar o fio. Tudo bem que os poderes constituídos repudiem a ditadura e renovem seus compromissos democráticos, mas se excedem aqueles que tentam reescrever a História. Houve um golpe, um presidente foi deposto ilegitimamente, isso é inquestionável. Mas o Congresso da época chancelou tudo: não dá para apagar essa parte triste.
Um dos autores da proposta, juntamente com o colega Randolfe Rodrigues (PSOL-AL), o senador Pedro Simon (PMDB-RS) antecipou-se às críticas garantindo que a intenção não é reconstituir os fatos. Nas suas próprias palavras, a História apenas vai dizer que, naquele dia, “o presidente do Congresso usurpou a vontade popular de maneira estúpida e ridícula, depondo o presidente da República”. A decisão, de fato, é comparável à que, em abril deste ano, devolveu simbolicamente o mandato de senador ao líder comunista Luiz Carlos Prestes. Também a Câmara, numa iniciativa recente, tomou a mesma atitude em relação a deputados que, ao longo de duas décadas de regime militar, foram cassados, impedidos de exercer o mandato e, em muitos casos, perseguidos. Por isso, passaram à História, o que não implica a necessidade de se tentar reescrevê-la.
No caso específico de Jango, a recente exumação contribuiu também para o país jogar luz sobre uma figura pública que, deposta no auge da popularidade, chegou a ter as referências a seu nome proibida. Ou, o que é pior, passou a ser lembrada de forma deturpada. Desde a redemocratização, porém, a trajetória política do presidente deposto em meio a um clima de radicalização num cenário de polarização ideológica no auge da Guerra Fria vem sendo alvo constante de pesquisas e teses acadêmicas. E os historiadores e biógrafos têm melhores condições do que os políticos de definir um perfil menos idealizado dessa e de outras figuras públicas do país.
Assim como as acusações que acabaram sendo usadas para justificar o golpe contra um presidente temido pela defesa das reformas de base, entre as quais a agrária, também os processos de reabilitação de imagem costumam ser parciais. Por isso, o país não deve olhar o passado apenas como uma etapa que pode ser revista, mas também para se dar conta do quanto avançou no aperfeiçoamento da democracia.
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Depois da questionável pirotecnia de viés eleitoreiro promovida pelo Planalto em torno da exumação do ex-presidente João Goulart, o Congresso Nacional promoveu um debate até a madrugada de ontem para anular a sessão do dia 2 de abril de 1964, que declarou vaga a Presidência da República e oficializou o golpe militar. A onda revisionista das instituições brasileiras começa a virar o fio. Tudo bem que os poderes constituídos repudiem a ditadura e renovem seus compromissos democráticos, mas se excedem aqueles que tentam reescrever a História. Houve um golpe, um presidente foi deposto ilegitimamente, isso é inquestionável. Mas o Congresso da época chancelou tudo: não dá para apagar essa parte triste.
Um dos autores da proposta, juntamente com o colega Randolfe Rodrigues (PSOL-AL), o senador Pedro Simon (PMDB-RS) antecipou-se às críticas garantindo que a intenção não é reconstituir os fatos. Nas suas próprias palavras, a História apenas vai dizer que, naquele dia, “o presidente do Congresso usurpou a vontade popular de maneira estúpida e ridícula, depondo o presidente da República”. A decisão, de fato, é comparável à que, em abril deste ano, devolveu simbolicamente o mandato de senador ao líder comunista Luiz Carlos Prestes. Também a Câmara, numa iniciativa recente, tomou a mesma atitude em relação a deputados que, ao longo de duas décadas de regime militar, foram cassados, impedidos de exercer o mandato e, em muitos casos, perseguidos. Por isso, passaram à História, o que não implica a necessidade de se tentar reescrevê-la.
No caso específico de Jango, a recente exumação contribuiu também para o país jogar luz sobre uma figura pública que, deposta no auge da popularidade, chegou a ter as referências a seu nome proibida. Ou, o que é pior, passou a ser lembrada de forma deturpada. Desde a redemocratização, porém, a trajetória política do presidente deposto em meio a um clima de radicalização num cenário de polarização ideológica no auge da Guerra Fria vem sendo alvo constante de pesquisas e teses acadêmicas. E os historiadores e biógrafos têm melhores condições do que os políticos de definir um perfil menos idealizado dessa e de outras figuras públicas do país.
Assim como as acusações que acabaram sendo usadas para justificar o golpe contra um presidente temido pela defesa das reformas de base, entre as quais a agrária, também os processos de reabilitação de imagem costumam ser parciais. Por isso, o país não deve olhar o passado apenas como uma etapa que pode ser revista, mas também para se dar conta do quanto avançou no aperfeiçoamento da democracia.
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