NELSON MANDELA
A África do Sul, governada há quase 20 anos pelo partido de Mandela, o Congresso Nacional Africano (CNA), suprimiu as barreiras raciais e conseguiu fazer emergir uma classe média urbana multirracial capaz de pagar escolas de qualidade para seus filhos.
Mas, desde 2009, o crescimento econômico se estancou, e as tensões sociais se acumulam. No fim de 2012, uma onda de greves selvagens, que deixou 60 mortos e se estendeu ao longo de 2013, acelerou a depreciação da moeda.
O país mais rico do continente africano tem mais da metade da população vivendo abaixo da linha da pobreza (52%) e o desemprego é crônico. “O que morre com Mandela?”, questionou um editorial da imprensa sul-africana.
Nelson Mandela esperava fervorosamente que o começo da democracia na África do Sul fosse o início de um recomeço político, econômico, cultural e social que se espalharia por toda a África e, de uma vez por todas, acabaria com a percepção do continente como “perdido”.
Frequentemente, a transição da África do Sul à democracia e à paz é descrita como um milagre político. Muitos acreditavam que o conflito no país tão intratável que uma solução pacífica e reconciliação entre negros e brancos ia além do impossível. Mandela, que passou quase três décadas aprisionado pelo regime por causa de seu ativismo contra o sistema brutal, tornou-se símbolo do milagre da transição. Sua habilidade de, visivelmente, perdoar e olhar para o futuro foi o fundamento da nova democracia, digno de conto de fadas.
A contribuição histórica de Mandela à democracia em desenvolvimento na África do Sul era ajudar a costurar um consenso amplo para a nova ordem democrática. Seu propósito era “conquistar um novo espaço para respirar, onde impulsos poderiam ser resolvidos, inimizades, subjugadas, e as afinidades se reformulariam”. Ao longo da transição, sua liderança ajudou a manter a confiança da maioria negra pobre e a lealdade para com o CNA. Ajudou também a aliviar os temores da classe média predominantemente branca, bem tratada e alcovitada durante décadas, e com medo da maioria negra.
Mandela, muitas vezes, criticou publicamente os sul-africanos brancos, mas suas advertências foram abrandados em virtude de seus sorrisos e abraços – ele até mesmo abraçou seu carcereiro na antiga prisão. O homem alto, de riso fácil – em discursos, constantemente zombava de si mesmo carinhosamente –, com suas camisetas folgadas mesmo em ocasiões formais, abriu muitos aspectos de sua vida, incluindo um complicado divórcio de Winnie Madikizela-Mandela ao escrutínio público. Mandela era um político hábil, com gestos imaginativos, muitos deles no campo dos esportes. Ele era o mestre das comunicações, com um talento para o gesto simples, que fala com a alma a seus compatriotas. Durante o mundial de rúgbi, em 1995, Mandela demonstrou isso e se tornou querido pelos brancos ao ostentar a camisa número 6 do capitão do time sul-africano, François Pienaar.
Ainda na presidência, deixou claro sobre como gostaria de ser lembrado na História. Em um discurso na Universidade de Potchefstroom, em fevereiro de 1996, disse: “Vou passar por esse mundo apenas uma vez. E não quero desviar minha atenção de minha tarefa – a qual é unir a nação”. Ainda mais reveladora foi a frase seguinte: “Estou escrevendo meu próprio testamento porque estou me aproximando de meu fim. Quero poder dormir pela eternidade com um largo sorriso em meu rosto, sabendo que a juventude, os formadores de opinião e toda gente está tentando unir a nação”.
*Professor da Universidade de Witwatersrand e prefaciador de No Easy Walk to Freedom, de Mandela (Clarke’s, 2013)
WILLIAM GUMEDE*
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