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terça-feira, 14 de janeiro de 2014

ROLEZINHO VIRA CAUSA DE MOVIMENTOS SOCIAIS

(ALEX SILVA/ESTADÃO CONTEUDO)
ZERO HORA 14/01/2014 | 06h05

Discriminação de "Rolezinho" em São Paulo vira causa de movimentos sociais. Após repressão policial e liminar da Justiça, passeio de jovens da periferia em shoppings de São Paulo virou bandeira de ativistas



Incomodados com a multidão de jovens da periferia, a maioria negros, cantando refrões de funk ostentação nos corredores, as direções de shoppings de São Paulo entraram na Justiça para impedir os chamados "rolezinhos". Conseguiram liminares a seu favor, com base nas quais a polícia reprimiu fortemente as aglomerações, com uso de bombas de gás lacrimogêneo e cassetetes.

No começo, os rolezinhos eram convocados por cantores de funk, em resposta a um projeto de lei que proibia bailes do estilo musical nas ruas da capital paulista. Agora, são promovidos por ativistas de movimentos sociais, como forma de protesto contra o preconceito e a segregação social.

Os passeios romperam a fronteira paulistana. Em Porto Alegre, há dois eventos sendo convocados por meio Facebook: no Shopping Moinhos, no próximo domingo, e no Barra Shopping, em 1º de fevereiro.

— Estamos caminhando para uma consequência mais política do rolezinho, o direito a estar na cidade — comenta o antropólogo Alexandre Barbosa Pereira, professor da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp).

Para ele, a grande questão é que, se fossem jovens de classe média, não seria caso de polícia (leia a entrevista ao lado).

Um vídeo que vem sendo compartilhado nas redes sociais pelos apoiadores do rolezinho é citado como exemplo. Nas imagens, gravadas em 2011, bixos da Faculdade de Economia da Universidade de São Paulo (USP) tomam conta da praça de alimentação de um shopping, sem qualquer intervenção da polícia ou de seguranças privados.

"Rolezeiros" querem " pertencer a esse mundo"

No último sábado, a Polícia Militar deteve três pessoas no Shopping Metrô Itaquera. Os jovens teriam furtado objetos. Em eventos anteriores, no entanto, mesmo sem registro de roubos ou de quebra-quebra, dezenas de "rolezeiros" foram levados para a delegacia (confira na linha do tempo).

— A sociedade não está entendendo que não se trata de uma manifestação. Esses pequenos grupos são movimentos de ostentação. Eles estão tentando participar daquela realidade apresentada na TV, nos clipes musicais, e querem pertencer a esse mundo, que não é real para eles, mas eles querem participar — comenta o advogado André Zanardo, membro do coletivo Advogados Ativistas, que apoia causas populares.

Na opinião de Zanardo, diante da repercussão das medidas repressivas, o rolezinho se tornou uma "crítica anticapitalista". Esse é o tom da descrição dos eventos convocados para o fim de semana dentro e fora de São Paulo. Um deles sugere levar pão com mortadela para ser consumido na praça de alimentação do shopping e entrar nas lojas apenas para experimentar roupas. A convocatória diz ainda para "fazer tudo de maneira pacífica, sem querer causar tumulto, só a presença já incomoda bastante".


Aglomerações de jovens preocupam comerciantes


Apesar de ter se iniciado de forma pacífica no fim do ano passado, o “rolezinho” pelos shoppings de São Paulo já preocupa comerciantes. O presidente da Associação Brasileira de Lojistas de Shopping (Alshop), Nabil Sahyoun, lembra que este é um movimento de adolescentes, menores de idade, que vem incentivando um “constrangimento” dentro de estabelecimentos privados.

– Estivemos com o secretário de Segurança de São Paulo e estamos monitorando as ações. Vamos abrir uma ação judicial contra os pais de quem for identificado, caso sejam chamados à delegacia, prestem depoimento e não tomem nenhuma atitude com relação à proibição de seus filhos organizarem este tipo de ação – argumentou Sahyoun.

Ele diz que a repressão da Polícia Militar, como a que ocorreu no final de semana, durante a retirada dos jovens do Shopping Metrô Itaquera, serve para evitar a desordem:

– Imagine mil pessoas entrando no shopping, com gritos de guerra. Começam a correr, e, lá dentro, estão grávidas, idosos, mães com crianças. Quem vai se responsabilizar?

A Corregedoria da PM irá apurar se os agentes que participaram da ação cometeram abusos, disse ontem o governador paulista, Geraldo Alckmin, reforçando que o papel do Estado não é fazer a segurança de locais privados. Segundo Alckmin, os policiais foram até o local porque uma decisão judicial impedia o ingresso do grupo no shopping.

Dez jovens, todos maiores de idade, serão intimados a comparecer à Justiça para explicar sua participação no rolezinho. Os adolescentes deverão contar a sua versão ao juiz, que analisará cada caso e decidirá se eles pagarão ou não uma multa de R$ 10 mil por dia, prevista na liminar. Conforme o Tribunal de Justiça de São Paulo, foram solicitadas cinco liminares por shoppings: duas foram negadas e três, concedidas (shoppings Campo Limpo, Metrô Itaquera e JK Iguatemi).

Em sua decisão, que diz respeito ao JK Iguatemi, um dos mais luxuosos da cidade, o juiz Alberto Gibin Villela da 14ª Vara Cível de São Paulo, diz que “o direito à livre manifestação está previsto na Constituição Federal. (...) De fato, se o poder de manifestação for exercido de maneira ilimitada a ponto de interromper importantes vias públicas, estar-se-á impedido o direito de locomoção dos demais; manifestação em Shopping Center, espaço privado e destinado à comercialização de produtos e serviços impede o exercício de profissão daqueles que ali estão sediados.”



“Se fossem de classe média, não seria caso de polícia”

Para o antropólogo Alexandre Barbosa Pereira, professor da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), a forte reação contra os rolezinhos deu aos eventos uma nova proporção, com contornos de manifestações políticas. Membro do grupo interdisciplinar O Ser Humano e sua Inserção Social, Pereira falou com Zero Hora sobre o assunto na tarde de ontem, por telefone. Confira os principais trechos:

Zero Hora – O que esses jovens pretendem com os chamados rolezinhos nos shoppings?

Alexandre Barbosa Pereira – É muito mais um espaço de encontro, de azaração, de paquera, em um local de prestígio da nossa sociedade, que é o shopping center. A motivação é essa. Agora, indiretamente, inclusive pela reação que teve a esse evento, a gente pode pensar em uma série de recados que eles estão deixando sobre a desigualdade da sociedade, um preconceito muito forte de classe, de raça, e, por outro lado, de certa forma, um pouco essa cidadania pautada só no consumo.

ZH – Por que os comerciantes se sentiram amedrontados com esses passeios coletivos?

Pereira – Sempre existiram encontros de jovens em shoppings, inclusive estão circulando imagens de estudantes de Economia da Universidade de São Paulo fazendo uma bagunça, tranquilos. Essa reação me parece que começa por três fatores. Um é de classe – são jovens pobres –, o segundo é de cor e raça, e o terceiro é justamente porque são jovens, são adolescentes. E acho que há um problema na nossa sociedade de lidar com a juventude. A grande questão é que, se fossem jovens de classe média, certamente não seria a polícia que seria acionada. Seria criada outra solução. Como são jovens da periferia, a polícia foi usada como elemento de autoridade e com a imposição de uma certa força sobre eles.

ZH – Na sua opinião, a ação da polícia foi desmedida?

Pereira – Se a gente for olhar tudo o que está sendo tratado como tumulto e correria, sempre começa após a ação da polícia – essa ação desmedida de força policial. Eu me pergunto se o mesmo aparato de força e até a agilidade que a Justiça teve para soltar liminar impedindo o direito de ir e vir seria usado se um jovem estivesse sendo baleado na periferia onde eles moram. Isso é uma questão de pensar os valores da nossa sociedade. Estão dando mais importância aos bens, ao consumo, ao patrimônio do que à própria vida das pessoas. Inclusive, essa ação da polícia pode colocar em risco outras pessoas que não estão no rolezinho, com balas de borracha, essas coisas. E essa ação acabou até potencializando o evento.

ZH – Há rolezinhos sendo organizados agora em repúdio à repressão, inclusive com apoio de outros setores da sociedade.

Pereira – É interessante ver que (os rolezinhos) vão gerando consequências. Estamos caminhando para uma consequência mais política do rolezinho, o direito a estar na cidade. Há vários casos que acontecem isoladamente, que não tomam essa proporção. De certa forma, esse grupo, em massa, traz como consequência uma repercussão maior, mas o racismo é cotidiano, o preconceito de classe existe cotidianamente nesses pontos de prestígio onde está a classe média alta.


LINHA DO TEMPO

Os rolezinhos

— Estes encontros nos shoppings de São Paulo começaram no final de 2013, reunindo centenas de jovens da periferia. Entre os primeiros rolezinhos, estavam atos organizados por cantores de funk em resposta à aprovação pela Câmara Municipal de São Paulo de um projeto de lei que proibia bailes do estilo musical nas ruas da capital paulista. A proposta foi vetada pelo prefeito Fernando Haddad no início de 2014.

— No início de dezembro, os comerciantes do Shopping Aricanduva, na Zona Leste, tiveram de baixar as suas portas durante um tumulto seguido de diversas tentativas de roubo às lojas durante o rolê, conforme o Sindilojas-SP.

— Em 7 de dezembro, cerca de 6 mil jovens haviam ocupado o estacionamento do Shopping Metrô Itaquera, que atrai gente de todas as regiões da cidade devido ao fácil acesso, e também foram reprimidos.

— Cantando refrões de funk ostentação, dezenas entraram no Shopping Internacional de Guarulhos, no dia 14 de dezembro. Ao todo, 23 foram levados à delegacia.

— No dia 22 último, no Shopping Interlagos, de classe média, os manifestantes foram revistados assim que chegaram ao local e um forte esquema policial foi montado.

— Um dia antes, a polícia foi chamada pela administração do Shopping Campo Limpo e não constatou nenhum tumulto, mas permaneceu no estacionamento para inibir e também entrou no shopping com armas de balas de borracha e bombas de gás.

— O shopping JK Iguatemi, — considerado um dos mais luxuosos da cidade — conseguiu no final da semana passada uma liminar na Justiça proibindo as manifestações, com previsão de multa de R$ 10 mil a quem fosse identificado causando tumulto. Outros quatro estabelecimentos também conseguiram liminar proibindo o ingresso de manifestantes.

— No último sábado, a Polícia Militar usou bombas de gás lacrimogêneo e efeito moral, além de balas de borracha contra um grupo de aproximadamente mil pessoas que se reuniram para um rolezinho no shopping Itaquera, na zona leste da cidade.

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