Blog, Twitter e Orkut vão contar histórias de favelas sob jugo do tráfico ou das milícias; anonimato será garantido - 11/12/2010 às 23h04m; Maria Elisa Alves
RIO - Durante a ocupação do Complexo do Alemão pelo estado no mês passado, depois de décadas de domínio do tráfico, foi comum ver moradores apontando para militares e policiais os esconderijos e as casas de traficantes. Os gestos e as vozes, mesmo que ainda tímidos, revelaram muito mais do que os redutos dos bandidos. Mostraram que a comunidade, que durante anos viveu amordaçada pela lei do silêncio imposta pelos criminosos, finalmente conseguia ter voz. Mas, se no Alemão a liberdade de expressão começa agora a ser mais do que um sonho distante, o mesmo não acontece na maioria das favelas do Rio, onde hoje cerca de 1,070 milhão pessoas ainda vivem sob o jugo de milicianos ou traficantes. Para conhecer suas histórias, O GLOBO lança hoje o projeto Favela Livre, um espaço que pretende, além de resgatar relatos de anos e anos de opressão nesses locais, discutir soluções.
O Favela Livre usará a nova tecnologia para falar dos velhos problemas das favelas cariocas. Um blog ( www.oglobo.com.br/favelalivre ) entrará no ar hoje, e leitores das comunidades dominadas poderão ter seus posts - contando sonhos, explicando como a violência afeta suas vidas, mostrando o sofrimento de perder um filho para o tráfico - publicados, após mediação de jornalistas do GLOBO. Os temas são livres e podem ir desde histórias cotidianas, como a obrigatoriedade de comprar botijões de gás por valores mais altos em locais indicados por milicianos, a textos sobre a esperança de mudanças nas favelas. Denúncias sobre crimes não fazem parte do projeto e serão encaminhadas à polícia. O anonimato - condição que, para muitos, significa a diferença entre morrer e continuar vivo - será garantido pelo GLOBO.
Especialistas em urbanização e violência urbana, por exemplo, também vão enviar artigos, selecionados pela editora assistente Liane Gonçalves e pelo editor adjunto Jorge Antônio Barros. Os 228 mil moradores das favelas que já têm uma das 13 Unidades de Polícia Pacificadora (UPPs) também podem colaborar, escrevendo sobre o que mudou com a presença do estado. O mesmo vale para os 102.735 habitantes dos complexos do Alemão e da Penha, que, embora não tenham ainda UPPs, viram seus territórios serem retomados pelo poder público.
Repórteres da Editoria Rio vão ganhar espaço para contar os bastidores de suas visitas às favelas e detalhes que não foram publicados no jornal e no site. A estreia nesse campo será de Antonio Werneck, que lembrará as duas vezes em que foi à Vila Cruzeiro ocupada pelos bandidos e os primeiros momentos da comunidade retomada pelo estado:
"Fui três vezes à Vila Cruzeiro. A primeira, quando o jornalista Tim Lopes desapareceu; a segunda, para cobrir um show de Caetano Veloso; e a última, quando as forças de segurança tomaram a favela. Só pude entrar sem dar explicações ou pedir autorização quando a região voltou ao controle do estado."
Além do blog, um perfil no Twitter ( www.twitter.com/favelalivre ) receberá mensagens dos moradores de favelas aonde a democracia ainda não chegou de fato, como mostrou a série "Os brasileiros que ainda vivem na ditadura", publicada pelo GLOBO em 2007. Ganhadoras de vários prêmios, as reportagens mostraram que direitos básicos, como liberdade de expressão, direito de associação e inviolabilidade do lar, eram constantemente desrespeitados.
Um dos casos que ilustraram a série foi a história do funcionário público Cláudio Daltro Barbosa, que tatuou nas costas uma carta de 13 linhas, misto de declaração de amor e despedida, endereçada ao filho, Diego, desaparecido após um desentendimento com um PM ligado à milícia da Vila Sapê, em Jacarepaguá. Diego e o miliciano discutiram por causa de uma mulher. Depois disso, ele passou a ser um dos cerca de 7.300 casos de desaparecimentos catalogados, de 1993 até junho de 2007 pelo Serviço de Descoberta de Paradeiros da Delegacia de Homicídios. No vácuo deixado pelo estado, a ditadura imposta por esses grupos no Rio produziu, em 14 anos, 54 vezes mais desaparecidos que os 136 registrados em todo o país nos 21 anos do regime militar.
O Favela Livre também estará no Orkut: hoje, entra na rede social um perfil do projeto e uma comunidade dedicada a ele. E-mails também serão uma fonte de contato dos leitores, moradores e demais colaboradores. Basta mandar as mensagens para favelalivre@gmail.com. Quem não tiver acesso à internet pode procurar o Serviço de Atendimento ao Leitor (SAL) do GLOBO, pelo número 2534-4324.
"O Favela Livre é um espaço para se discutir e se conhecer histórias, que não podiam ser contadas, de quem ainda vive a ditadura do tráfico e da milícia. É também um fórum de discussão entre especialistas, moradores de áreas com UPP. Nos acostumamos a achar normal que mais de um milhão de pessoas ainda vivam fora da democracia, sem os direitos dos cidadãos do asfalto. Sempre recebi muitos e-mails de moradores de favelas, querendo contar, anonimamente, suas vidas. Agora, abrimos esse espaço" diz o editor da Rio, Paulo Motta, que teve a ideia de criar o projeto.
Como participar:
O blog do Favela Livre está no ar: www.oglobo.com.br/favelalivre
Siga no Twitter:
Usuários podem escrever para @FavelaLivre
No Orkut:
Foram criados o perfil Favela Livre e uma comunidade com o mesmo nome .
Serviço de Atendimento ao leitor (SAL): telefone para 2534-4324.
Mensagens também podem ser enviadas para o e-mail: favelalivre@gmail.com
A PAZ SOCIAL É O NOSSO OBJETIVO. ACORDAR O BRASIL É A NOSSA LUTA.
"Uma nação perdida não é a que perdeu um governante, mas a que perdeu a LEI."
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